Em Fuga


(...) Com o meu amigo, a quem chamávamos Príncipe, o tema acabou por degenerar em obsessão. Não havia notícia no jornal sobre fugas para o lado de lá da fronteira que ele não coleccionasse, colando-as cuidadosamente numa pasta. Conhecia todas as histórias. A arguta família da RDA que coseu vários impermeáveis de peliça para fazer um balão de ar e voar nele até ao outro lado da fronteira; o casal da Estónia que se besuntou com banha de ganso e nadou cem quilómetros até à Finlândia. Passaram dois dias na água gelada, mas o resto da vida a gozar o sol radioso da Finlândia. O Príncipe também conhecia a história do pintor Sachanevich, que durante uma travessia no mar Negro saltou do navio em andamento e foi parar à Turquia. Sabia também do escultor Petrov, que se cobriu de bronze e se fez passar por uma estátua que foi enviada para uma exposição em Paris. O Petrov passou uma semana inteira numa caixa de madeira mas nunca chegou a Paris. Numa paragem em Amesterdão, um oficial da alfândega abriu o caixote porque este exalava um fortíssimo cheiro a merda. De lá de dentro saiu então o Petrov pintado de bronze, pedindo asilo político na qualidade de artista perseguido.

Wladimir Kaminer
Russendisko: Discoteca Russa