Histórias da Loucura Normal: O Dia do Gafanhoto

O DIA DO GAFANHOTO
NATHANAEL WEST
(1939)
Por volta da hora de saída do trabalho, Tod Hackett ouviu um grande estrondo na rua do edifício onde trabalhava. O chiar do couro misturado com o tinir do ferro e, acima de tudo, o rufar de mil cascos em trote. Tod debruçou-se imediatamente sobre o parapeito da janela.
Um exército misto de cavalaria e infantaria avançava pela estrada fora. Movia-se caoticamente como uma turba, como se a fugir de uma batalha perdida. Os dólmanes dos hussardos, os pesados shakos dos guardas. Os cavaleiros hanoverianos agitavam-se desordenadamente com os seus barretes de couro e ondulantes plumas vermelhas. Atrás da cavalaria seguia a infantaria, um mar revolto de sabretaches flutuantes, mosquetes inclinados, bandoleiros cruzados e cartucheiras oscilantes. Tod reconheceu na multidão a infantaria escarlate do exército inglês e as suas ombreiras, a infantaria negra do Duque de Brunswick, os granadeiros franceses com as suas enormes polainas, os Escoceses de joelhos nus por baixo das saias de xadrez.
Enquanto Tod observava a cena, um homem atarracado, de capacete de cortiça na cabeça, camisola e sapatilhas, dobrou, rápido como uma flecha, a esquina do edifício em perseguição do exército.
— Nível Nove, meus camelos! Nível Nove! — gritava ele através de um pequeno megafone.
A cavalaria imobilizou os cavalos e a infantaria retomou a sua marcha lenta. O homem atarracado do capacete de cortiça corria atrás deles de punho erguido e a praguejar.
Tod assistiu a tudo até eles desaparecerem por trás de meio barco a vapor do Mississipi, depois pousou o lápis na prancha de desenho e saiu do escritório. Dei-xou-se ficar estático por uns momentos no passeio, a decidir se iria para casa a pé ou de eléctrico. Ainda não tinham passado três meses desde que se mudara para Hollywood e tudo era excitantemente novo, mas ele era preguiçoso e não gostava de caminhar. Acabou por concluir que o melhor seria apanhar um eléctrico até Vine Street e percorrer o resto do caminho a pé.
Snob, 2018
(baldio)
trd. Manuel João Neto
(lido em 2023)