Viajantes: A Casa da Aranha

A CASA DA ARANHA
PAUL BOWLES
(1955)
Era cerca da meia-noite quando Stenham deixou a porta de Si Jaffar.
— Eu não preciso que venha alguém comigo — dissera ele, sorrindo falsamente para desmentir o som da sua voz, pois receava ter parecido aborrecido ou sido abrupto, e Si Jaffar, afinal, estava apenas a exercer os seus direitos enquanto anfitrião ao enviar esta pessoa a acompanhá-lo. — A sério, eu não preciso de ninguém.
Ele queria regressar sozinho, mesmo com todas as luzes da cidade apagadas. O serão havia sido interminável, e a ele apetecia-lhe correr o risco de virar as esquinas erradas e ficar temporariamente perdido; se estivesse acompanhado, a longa caminhada seria quase como uma continuação de estar sentado no salão de Si Jaffar.
Em qualquer caso, agora já era tarde de mais. Todos os membros masculinos da família vieram à porta, tinham até ficado em pé no beco molhado, insistindo em que o homem fosse com ele. Os adieux destes eram sempre demorados e elaborados, como se ele estivesse a partir para o outro lado do mundo e não para o extremo oposto da medina, e gostava conscientemente disso, porque era uma parte daquilo que julgava dever ser a vida numa cidade medieval. No entanto, não havia qualquer precedente de que lhe impusessem a presença de um protetor, e ele sentia que não havia justificação para aquilo.
Quetzal, 2014
(Serpente Emplumada)
trd. Jorge Pereirinha Pires
(lido em 2015)